Dezembro 9, 2022

Entrevista a Aurora Carapinha

A propósito dos fenómenos climatéricos que têm fustigado a área metropolitana de Lisboa nos últimos dias, e que estiveram na génese de inundações com consequências gravosas – que incluem a perda de uma vida humana em Algés – não apenas na capital mas um pouco por todo o país, Aurora Carapinha, Arquitecta Paisagista, professora na Universidade de Évora, foi entrevistada por Sara de Melo Rocha para o programa CNN Meia Noite, na madrugada de 9 de Dezembro.

Aurora Carapinha apontou, para lá de causas mais imediatas, as origens deste problema e o somatório de erros que, acumulados desde há décadas, deixam a população exposta ao risco. Sublinhando a excepcionalidade da precipitação ocorrida e a dificuldade óbvia que tal implica, reflectiu a partir da escala do ordenamento e planeamento da paisagem, e identificou as ocupações urbanísticas indevidas de zonas sensíveis para a normal ocorrência do ciclo da água e também do ciclo do carbono, como a impermeabilização indevida dos logradouros e de outros espaços fundamentais ao equilíbrio destes ciclos, interrompendo por exemplo os caminhos lógicos da água, para os quais a toponímia nos alerta, recordando. À escala do projecto, e das intervenções específicas, abordou o Plano de Drenagem previsto para Lisboa e anunciado com vigor face às recentes ocorrências, valorizando o excelente domínio tecnológico que este representa, mas destacando os custos financeiros e energéticos que implica, ficando aquém ao nível da valorização ou gestão, tanto ecológica como económica, do recurso água, fundamental à vida humana e que, desta forma, não é valorizado ou incorporado nos ecossistemas urbanos, num desperdício que se afigura insano, no nosso contexto climático.

A Professora da Universidade de Évora apontou ainda o impacto dramático que uma gestão urbanística assente em decisões partidárias – imediatistas e sujeitas aos ciclos eleitorais – em detrimento de decisões políticas – de longo prazo – tem, sacrificando o respeito pelo meio e, consequentemente, a qualidade de vida e segurança das populações à gestão do momento, sem pensar no futuro. Reclamou assim uma gestão da cidade com a natureza, e não contra a natureza, procurando soluções de integração dos ciclos naturais no desenho da paisagem urbana, com maiores garantias de perenidade, em linha com os conceitos já anteriormente defendidos por Gonçalo Ribeiro Telles para Lisboa e para o país.